P E R S O N A L | It's about me but can also be about you or the person next to you



Há um ano atrás, faltavam exatamente três dias para o meu primeiro exame da faculdade. A oral de Anatomia. Tive um semestre inteiro para deixar a pressão acumular-se e, tendo cerca de 15 dias de "férias" até ao exame, eles foram passados sobretudo a pensar. A pensar em como não iria conseguir. Em como as palavras não me iriam sair da boca. Em como - imaginem só esta - o meu sotaque nortenho (que nem é o mais vincado) ia fazer com que as pessoas não me levassem a sério no dia. Em como tudo. A minha cabeça não parava de calcular o tempo que faltava para o exame, o tempo que não podia perder, durante o dia, nem a comer, para ir logo logo estudar de seguida. Na minha mente, imaginava um empenho que estava a aplicar sobre a prova, quando na verdade, só me estava submeter a quantidades industriais de stress físico - porque as noites começavam a ser muito mal dormidas - e psicológico. 



Toda a minha vida, lidei bem com as minhas obrigações. Os meus pais sempre me proporcionaram uma vida extraordinária, sempre se esforçaram imenso para me fazerem sentir especial e amada e eu devia-lhes - e sobretudo a mim mesma - empenho, esforço e luta por uma boa vida. E isso passava, não só mas também, pelo meu sucesso escolar. Aprendi a ter deveres e a saborear o direito de ser boa numa coisa fundamental: o trabalho.

Quando cheguei à faculdade, principalmente a um curso em que se exigia o melhor dos "melhores alunos", essa sensação de confiança naquilo que eu sabia foi-se perdendo, inicialmente. Foi como se começasse do zero. 

Esta semana, voltei a relembrar-me de tudo aquilo que aconteceu há um ano atrás. Por um lado, o encanto pelas matérias, pelo que um dia poderia vir a ser, a paixão pelo verdadeiro conhecimento que ia detendo. Por outro, a insegurança e o primeiro ataque de ansiedade - e único - que tive na minha vida. Durante dias, senti-me mesmo um vegetal, num impasse entre o que iria acontecer - o exame - e o que eu queria sentir: alegria e motivação por estar onde estava. 

Um ano depois, agradeço que tenha passado por isso, por muito masoquista que isso pudesse parecer se eu dissesse isto a mim mesma há um ano atrás. Posso mesmo dizer que esse foi o pior momento da minha vida, até hoje. As piores semanas. O pior sentimento em relação a mim mesma. Mas também posso dizer que, sem ele, eu não teria parado. Parado para me pôr em primeiro lugar. Para voltar a acreditar que a) eu tinha um cérebro e b) toda a vontade do mundo para um dia vir a ser médica e que, juntos, podiam ir longe. 


A vida não é, nem nunca será, uma linha contínua e certa. No entanto, todos os dias são certos para decidirem o que querem que ela não seja e o que querem ser para ela. Posso dizer que a minha ficou bem mais bonita e com sentido depois de eu ter conseguido olhar para mim, de fora. Não dependeu só de mim tirar-me de um sítio escuro como aquele em que estive transitoriamente. A minha família esteve comigo. Eles sabiam que, mais importante do que um exame, era eu. E devo-lhes o meu "virar da página". 


Sejam pacientes convosco. Nenhuma "obrigação" - seja ela de que teor for - vale mais do que vocês mesmos.

Comentários

  1. Inês, perante este texto me ocorre dizer "obrigada". Lido com a ansiedade desde que me lembro de ser gente - podes rir, eu sei que chega a ter piada porque "que preocupações é que uma miúda de 6 ou 7 anos tem?" - e apesar de já saber exatamente o que fazer para a controlar, nem sempre é fácil e hoje é um desses dias. Esta semana está a ser particularmente difícil para mim e ler isto num fim duma frequência (à qual eu chamo exame porque não tivemos mais nenhuma durante todo o semestre...) que me correu terrivelmente mal e na qual senti o meu corpo a ir a baixo e sem forças - literalmente - acho que não posso dizer-te mais nada se não o "obrigada" que já promoveu mais do que isso. O teu sentido de oportunidade é perfeito.

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  2. tenho de admitir que estou rendida! Rendida à tua entrevista, a todo o teu blog e a todo o teu mundo! Durante uma hora mergulhei no teu blog, e descobri a Inês linda que existe e que me identifiquei tanto! Todas as tuas incertezas, as tuas lutas diárias, etc, tudo me identifiquei! Parabéns ! Parabéns pela transparência, pelo blog excelente que tens e que continues assim!

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  3. Identifiquei-me muito com o teu texto.
    Embora tenha sido há mais anos, o meu primeiro exame também ficou marcado. Não porque estivesse aterrorizada, mas sim receosa, porque foi exame ao cadeirão da faculdade. Toda a gente, de todos os anos, foram faze-lo.
    Mas é bom pensar naquela pressão que nos faz avançar =)

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  4. Subscrevo este texto todiiiiinho! Senti-me exatamente assim nos meus primeiros exames e os resultados que obtive não foram maus mas não eram os que eu queria ou achava que devia ter. O 1º semestre acabou por me ensinar que quando já não dá, quando o stress toma conta de nós e nos afeta em vários campos, temos de parar. Parar para relaxar e sermos nós outra vez. E no 2º semestre os resultados apareceram. E este ano vão ter de aparecer de novo, independentemente do aumento da dificuldade :)

    choosewhatstaysandwhatfadesaway.blogspot.pt

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  5. "A vida não é, nem nunca será, uma linha contínua e certa. " Uma grande verdade.
    Eu já tive alguns ataques de pânico, não são sempre mas eles de vez em quando ocorrem quando estou em situação de grande stress emocional. A verdade é que antes de exames entro quase em desespero

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  6. Nem sabes o quanto me revivi nas tuas palavras, passei exatamente o mesmo por causa de um trabalho de grupo. O trabalho de grupo. Digo mesmo que foi o pior momento a nível escolar que já passei. A mente consegue ser a nossa pior inimiga se nós o permitirmos claro! :)

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  7. Por vezes temos de ultrapassar certos obstáculos para chegar lá. E estás coisas faz com que o esforço calha a pena!

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  8. muito muito verdade. às vezes o mais difícil é atingir esse clique,

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  9. és fabulosa Inês e ler isto nesta altura ajuda a acalmar-me.
    Não durmo à uma semana porque só penso em como não vou conseguir passar na Frequência, na última da minha licenciatura. Sofro de ansiedade desde muito nova e nestes últimos dias tem-se apoderado muito de mim, saio para trabalhar e sinto-me a sufocar muitas vezes.
    Mas ao ler isto sinto-me mais calma. és maravilhosa, sabes sempre o que dizer mesmo sem saber que o estás a fazer ! :')

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  10. Nunca tive grandes problemas de ansiedade. Antes de um teste ou de um exame fico sempre nervosa, mas é o normal.
    Sei que estás num curso deveras exigente, porém espero que esse sentimento de insegurança e ansiedade não te volte a atormentar.

    R: Não conhecia esse perfil, mas gostei imenso. Obrigada por partilhares.

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  11. Obrigada!
    Identifiquei-me em tantos pontos que escreveste, que acabei de ler o texto aliviada. Estava a precisar de o ler - mesmo não te conhecendo de lado algum, menos tu não me conhecendo, estava mesmo a precisar destas certezas. Tal como tu, entrei o ano passado para a faculdade. Tive o meu primeiro - e único - ataque de ansiedade dias antes do primeiro exame. Foi um perído da minha vida difícil, mas também foi aquele em que melhor noção tive dos obstáculos que tinha, do que eu era e do que conseguia. Mudei de curso, mudei de faculdade. E se este ano, voltamos à mesma época, e se ainda restam memórias do que há um ano atrás a minha vida estava a ser... agora eu consigo controlá-lo melhor. Aprendi muito com a ansiedade e com os tempos difíceis e hoje, posso por em prática o que aprendi. E posso, eu mesma, ter a capacidade para mudar as coisas. Agradeço-te por me relembrares disso.

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  12. Não me recordo do meu primeiro exame da faculdade, mas lembro-me bem do primeiro ano que, para mim, foi complicado. A adaptação a um ambiente que desconhecia, a matérias de que não fazia ideia - um autêntico mundo novo que julguei, em determinados momentos, que nunca iria entender. Recordo-me de pensar que jamais me conseguiria integrar, acompanhar o ritmo, e convenci-me disto como se fosse uma verdade absoluta, como se o fim fosse aquilo. No momento achamos mesmo que não vamos conseguir, que se acabou, pronto, atingimos o nosso limite. Mas como disseste "a vida não é, nem nunca será, uma linha contínua e certa" e cinco anos depois aqui estou eu, de licenciatura e mestrado feitos. E digo sem qualquer dúvida que foram os mais intensos mas melhores anos da minha vida! Adorei o texto, é impossível não nos identificarmos com o que escreveste se já passámos pela experiência da universidade :)

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  13. Que escrita e pensamentos fantásticos Inês :))
    Isto é a prova viva de que devemos lutar por aquilo que realmente queremos!

    beijinho grande **

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  14. Obrigada, obrigada, obrigada! Deste-me o maior conselho de sempre!

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